domingo, 18 de março de 2012

Tio Boonmee pode recordar suas vidas passadas


Por GILBERTO AMENDOLA

Quanto maior for a capacidade de fabulação e a disponibilidade ao mergulho, melhor e mais intensa será a experiência do espectador. Essa é uma premissa que deve acompanhar aqueles que se aventurarem numa sessão do longa tailandês Tio Boonmee, Que Pode Recordar Suas Vidas Passadas, de Apichatpong Weerasethakul, vencedor da Palma de Ouro em Cannes.

Para se ter uma ideia do tipo de mergulho que o filme propõe, aqui vai um pedaço da sinopse: sofrendo de insuficiência renal, Tio Boonmee resolve passar os últimos dias de sua vida recolhido numa casa perto da floresta. Durante um jantar com a família, o espírito de sua esposa falecida aparece para ajudá-lo em sua jornada final – assim como Boonsong, filho de Boonmee, que retorna, após uma ausência prolongada, na forma de um ser da natureza (que modificou sua forma depois de ter sumido na floresta e copulado com uma macaca fantasma).
Sobre Boonsong (o homem-macaco) vale um parênteses. 

Jogo de duplicidade
O clima de fantasia percorre todo o filme, com destaque para a cena do jantar em família (repare a delicadeza com que o diretor faz surgir um fantasma em cena) e o momento em que uma princesa é conquistada por um bagre (um peixe). Aos poucos, as vidas do tio Boonmee vão se sobrepondo e adicionando camadas à narrativa. Faz-se, então, um jogo de duplicidade: ora, o personagem está vivo, ora, morto. Mas tudo fica bem explícito na última sequência do longa-metragem.

O diretor Apichatpong Weerasethakul conduz a fábula de Tio Boonmee, Que Pode Recordar Suas Vidas Passadas com extrema delicadeza e mantendo uma aura de fantasia e suspense. Weerasethakul parece não ter medo algum de parecer esquisito. Aliás, esse é o tipo de roteiro que um diretor como M. Night Shyamalan (Sexto Sentido, Corpo Fechado, Sinais e outros) adoraria estragar (vide seus últimos filmes).

Tio Boonmee traz uma experiência cinematográfica diferente para a maioria do público habituado com o cinemão comercial. Normal que cause algum estranhamento, mas quem der uma chance ao diferente será altamente recompensado. Um filme para ser assistido mais de uma vez.

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